domingo, 19 de fevereiro de 2012

O caminho faz-se caminhando?

«Nisto de manifestações populares, o mais difícil é interpretá-las. (…) Toda a manifestação é um corro-a-salvar-te de quem não pensa contribuir para a salvação senão com palmas e vivas. É este o ensinamento que toda a criatura lúcida tira das manifestações populares.» Fernando Pessoa

Parece que a crise do euro passou de uma fase aguda para uma fase crónica: no ano passado cada desenvolvimento político ou económico era motivo para reacções dos mercados financeiros, nomeadamente das principais bolsas de valores mundiais; este ano os mercados parecem imunes aos avanços e retrocessos das negociações do novo pacote de ajuda à Grécia, acompanhadas de sucessivas greves e motins nas ruas de Atenas. Não obstante, os mercados teimam em manter-se indiferentes.
Noutros partes da zona do euro (leia-se países mediterrânicos do Sul) há sinais de esperança, especialmente na concretização de reformas estruturais que permitam que as respectivas economias convivam com os rigores da partilha de uma moeda única com a Alemanha: a Irlanda recuperou parte da competitividade, o governo espanhol de Rajoy conquistou um amplo mandato para encetar as prometidas reformas, o “indigitado” novo primeiro-ministro italiano, Mario Monti, propõe-se concretizar reformas da segurança social e das leis laborais, enquanto em Portugal o governo assegura estar a cumprir escrupulosamente o acordo de reformas assinado com os seus financiadores.
Apesar destas reformas, a fragilidade das economias da zona do euro ameaça minar esses esforços: vamos assistir a uma acentuada queda do PIB na Grécia, Itália, Espanha e Portugal, e a economia da zona do euro como um todo corre o risco de se contrair. A crónica falta de crescimento ameaça, principalmente pelas consequências ao nível do desemprego, a estabilidade e coesão social.
As reformas estruturais podem melhorar as perspectivas de crescimento a longo prazo, mas no curto prazo são susceptíveis de conduzir a condições socialmente insustentáveis.
O “sentimento” dos mercados em relação à Europa parece ter melhorado, mas o caminho da recuperação é longo e escuro.
A questão é se queremos percorrê-lo.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Política e Comunicação Social

"Política de Escândalo" tem-se traduzido no método de comunicação política adoptado pelos Media e pelas organizações políticas. Este método de comunicação caracteriza-se, fundamentalmente, pela descredibilização constante dos oponentes políticos, como meio para atingir resultados na esfera política, nomeadamente em resultados eleitorais.

Este método acarreta dois tipos de consequências negativas em todo o processo subjacente ao funcionamento da democracia pluralista. Por um lado, o enfraquecimento da credibilidade dos oponentes políticos, que automaticamente descredibiliza as próprias organizações políticas. Esta descredibilização constante conduz os cidadãos a exercerem o seu direito de voto de uma maneira perversa: em vez de votarem no "melhor" candidato, votam no "menos mau". Por outro lado, põe em causa a legitimidade democrática do regime pois, os cidadãos não tendem a diferenciar os políticos pelas suas ideologias e convicções políticas, mas sim pelas suas acções negativas, o que promove da sociedade uma opinião negativa generalizada a toda a classe política.

Apesar deste novo conceito no seio da comunicação política, toda a descredibilização que se aponta às elites políticas não pode ser apontada exclusivamente designadas "Políticas de Escàndalo". Este modo de comunicação política surgiu quando se verificou uma correlação positiva entre este modo de comunicação, por um lado, bons resultados em processos eleitorais, e, por outro, um grau mais elevado da eficácia na comunicação política, traduzindo se em melhores resultados no mercado dos Media

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Da Democracia Deliberativa

Com o fracasso colossal do sistema comunista, o modelo democrático saiu amplamente vitorioso, alargando-se mais ou menos rapidamente àqueles tantos países que aos poucos se iam desembaraçando dos escombros do bloco soviético. Contudo, a par deste fenómeno, foram levantando-se, em paralelo, sérias interrogações quanto ao funcionamento do mesmo modelo democrático, visto que nos países economicamente mais desenvolvidos se assistia ao crescimento de uma forte desconfiança entre os cidadãos relativamente à actuação das instituições democráticas e, em especial, da classe política. A democracia liberal e representativa, baseada no sistema de mercado, que tanto vinha atraindo os novos Estados do leste europeu, manifestava-se, porventura, imperfeita, carecendo de melhoramentos e completude. Por consequência, verifica-se uma crescente despolitização das sociedades ocidentais que, de algum modo, aspiram agora a um novo entendimento do processo político, expresso não apenas numa forma nova de fazer política, mas, sobretudo, numa maior participação dos cidadãos. É neste contexto que emerge a ideia de democracia deliberativa, onde o diálogo, o debate e a argumentação possam ser os vectores fundamentais de um processo que visa uma cidadania mais participativa, bem como a melhoria qualitativa das decisões políticas.

O cânone democrático deliberativo, de um ponto de vista conceptual, deve bastante aos contributos teóricos de HABERMAS e de COHEN que o definiram, em geral, como sendo um modelo de discussão entre diversos participantes em que cada um argumenta em termos do bem comum, tem em consideração as razões invocadas pelos outros e procura chegar a uma posição de consenso. Á primeira vista, o modo de proceder das pessoas compreensivas e tolerantes quando decidem reunir-se para debater umas com as outras quaisquer assuntos, ainda que de carácter público e de interesse geral. Assentando, pois, no intercâmbio de ideias, argumentos e razões, o modelo democrático deliberativo intenta a proposta que melhor expresse o sentir colectivo da sociedade, por se revelar a melhor para todos, na medida em que o seu fim último é, ou deve ser, a justa prossecução do bem comum.

(Publicado no jornal «O Primeiro de Janeiro», em 01. 02. 2012)