Importa-se
de se despedir?
«Quando se
está preso, o pior é não poder fechar-se a porta.» ― Stendhal
A história resume-se em poucas
palavras: Albert Florence, um pacato cidadão americano residente em Nova Jersey
foi detido, há seis anos, pela polícia após ser acusado de não ter pago uma
multa de trânsito. Nos estabelecimentos prisionais onde foi ficou detido por
mais de uma semana até ser presente a um Tribunal, Florence foi por um par de vezes
sujeito a revistas, nomeadamente obrigado a tirar as roupas, levantar os órgãos
genitais e tossir em posição de cócoras, para que os guardas prisionais se
certificassem que não escondia qualquer objecto no corpo, conforme normas
daqueles estabelecimentos prisionais.
Depois de tal episódio, Albert Florence
avançou com um processo judicial (Florence v. Board of Chosen Freeholders of
County of Burlington), argumentando que as revistas que foi sujeito violam a
Quarta Emenda da Constituição americana, especialmente quando efectuadas rotineiramente
a pessoas detidas por delitos menores, já que as revistas policiais como as que
foi sujeito são uma medida extrema, que devem ser usadas apenas quando há
razões para acreditar que a pessoa específica pode esconder armas, drogas ou
outros objectos.
Muitos tribunais federais americanos
têm sustentado a argumentação de Florence, defendendo que a Constituição proíbe
tais revistas a pessoas presas por delitos menores, a menos que haja suspeita
individualizada.
Mas o Supremo Tribunal dos Estados
Unidos validou a actuação daqueles estabelecimentos prisionais, sustentando ser
permitida a realização de revistas rotineiras em pessoas que são acusadas de
crimes menores, mesmo que não exista nenhuma razão específica para acreditar
que eles estão a esconder qualquer objecto, argumentando, ainda, que os
carcereiros têm sérias dificuldades de operação e as revistas podem ajudar a
manter armas e doenças fora das prisões.
A decisão do Supremo Tribunal foi
tomada por cinco votos a favor e quatro contra, rejeitando assim a maioria dos
Juízes o argumento de que nos casos de pessoas detidas por delitos menores (p.
ex., condução com um farol do veículo fundido, multas de estacionamento não
pagas, andar de bicicleta sem uma campainha audível), nenhuma delas pessoas
poderia ter previsto ser preso e nenhuma, provavelmente, teria escondido armas ou
outros objectos dentro de suas cavidades corporais. Ser forçado a despir-se e ficar
nu perante estranhos é "humilhante e degradante", argumentam os
defensores das razões de Florence, classificando de “assustadora” a decisão do
Supremo Tribunal, cuja lógica pode transformar uma democracia num Estado
policial ao pretender eliminar todos os riscos em detrimento dos direitos
individuais dos cidadãos.
No Mundo actual, face aos novos
perigos e às novas ameaças, será legítimo substituir a liberdade, nomeadamente
a liberdade individual, por um conceito alargado de segurança, entendido como
«redução da incerteza»?
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